segunda-feira, 13 de junho de 2011

1.0 - Introdução


Atendendo à complexidade à volta do tema proposto para o trabalho, ao longo do mesmo vou tentar abordar pontos-chave que até ao fim vão desmistificando (se possível) a pergunta chave: “As Relações Públicas são ou não prejudiciais para a Democracia”.
Com a definição de Relações Públicas e a visão das mesmas em Portugal irei introduzir o leitor no contexto do tema, para de seguida expor pontos que complementados entre si, irão, espero eu, levar a uma resposta direccionada para um dos extremos.

1.1 - Definição de Relações Públicas

«Com o lema “fazer bem e fazer saber”, Relações Públicas são todo um conjunto de técnicas que vão permitir criar e manter uma imagem favorável entre uma empresa, instituição ou pessoa e o seu público» (Viale Moutinho, 2001: 142).
As Relações Públicas são uma actividade profissional que visa unir uma série de ferramentas em volta de um objectivo.
O objectivo pode ser variado, a candidatura de uma pessoa a umas eleições, o lançamento de uma empresa, entre outras. Visto de outra forma mais simples, elas procuram mostrar o lado positivo desse “produto” a quem querem que o produto seja “vendido”, de forma a alcançar o objectivo.
«Relações Públicas é tudo e nada» 1. Para se perceber melhor dou um exemplo, direccionado para a política:
«Os factos são incontestáveis: George W. Bush foi tão vira-casacas como John Kerry. Só que Bush contou a história primeiro. Ele e a sua equipa fizeram um trabalho de mestre quando contaram uma história sobre Kerry e a sua incapacidade de se ater a uma só história. Milhões acreditaram na mentira.
A equipa de Kerry respondeu com um esforço vão de salientar que Bush era tão vira-casacas como Kerry. É claro que essa história não podia pegar, porque a outra história já estava a correr. Foi perfeitamente indiferente se a história da equipa de Kerry era verdadeira ou não. A concorrência já estava a ter êxito com a venda dessa história, pelo que o pessoal de Kerry não tinha hipóteses de ser bem-sucedido com a sua» (Godin, 2006: 128/129).
Com esta história consegue-se perceber qual o poder que podem ter as Relações Públicas. No texto que citei, quando o autor fala em equipa, está a falar dos seus Relações Públicas. Aqueles que podem e devem
 «sugerir e coordenar políticas de tratamento dos públicos da empresa ou instituição; ajustar as suas políticas, procedimentos e acções que estão em conflito com o interesse público e com a sua sobrevivência» (Viale Moutinho, 2001: 142),
para depois elaborar um plano, devidamente bem pensado, para com a ajuda das ferramentas aplicar tudo isso em busca de um objectivo, seja ele qual for.

1 - Frase do Professor João Paulo Meneses na aula de EC2 no dia 26 de Abril.

1.2 - Metodologia de trabalho

Nas aulas da cadeira em que assisti preocupei-me em dar mais atenção a temas abordados que poderiam entrar nos pontos do meu trabalho. É de salientar que um dos pontos do meu trabalho (Comparação “figurativa” do papel dos Relações Públicas “reais” com outros que inconscientemente também o são) é um ponto arriscado para mim, pois poderá não ser bem aceite por quem corrige o trabalho devido a ser muito específico e, em algumas opiniões eventualmente não estar devidamente bem colocado em relação ao tema. Contudo quero deixar aqui expresso que tenho noção que em caso de não ser bem aceite, a responsabilidade é totalmente minha.
Além dos conhecimentos adquiridos em aula, fui fazendo pesquisas de forma a assegurar documentos que me poderiam ser úteis, via internet e também na biblioteca do ISLA Gaia. Com a ajuda do professor encontrei alguém profissional de Relações Públicas disposto a dar-me uma breve entrevista via e-mail para enriquecer o trabalho. Também me propus a fazer uma análise às Relações Públicas em Portugal, já que as mesmas devem ser avaliadas especificamente no nosso país.
Com isto penso ter matéria suficiente para desenvolver e concluir o tema “As Relações Públicas são ou não prejudiciais para a Democracia” e apresentar um trabalho final esclarecedor para mim, mas sobretudo para quem o ler.

2.1 - Visão das Relações Públicas em Portugal

Visto que é o primeiro ano que tenho contacto com a área das Relações Públicas, ainda não tenho uma opinião formada sobre as mesmas em Portugal. Talvez, como a maioria dos portugueses, o único contacto que tive até então com a expressão “Relações Públicas” foi através de promotores de eventos, na noite preferencialmente, que se intitulam de RP’s. E muito provavelmente é daí que provém a opinião generalizada dos portugueses acerca do que é um profissional de Relações Públicas. Esta vulgar opinião valoriza esses promotores, estando ao mesmo tempo a retirar mérito e credibilidade, vulgarizando aqueles licenciados que se esforçaram para o ser, e que vêm agora a sua imagem não ser reconhecida por culpa de pseudo-RP’s. Na minha opinião, há que lutar contra esta maré, cabendo aos profissionais de Relações Públicas elevarem esse nome, de forma a serem reconhecidos pela sua profissão que tem tudo para singrar cada vez mais nos dias que correm.
No mundo do jornalismo, o profissional tem em sua posse uma garantia. A Carteira Profissional do jornalista, é um trunfo que ele irá ter sempre para salvaguardar quaisquer confusões que possam ser alheadas à sua profissão, e ao mesmo tempo é um documento que o dignifica e reconhece. Já nas Relações Públicas o mesmo não acontece, ainda nenhuma entidade, por questões burocráticas ou não, levou adiante a pretensão de incluir na Classificação Profissional (CNP) a definição oficial de Técnico de Relações Públicas, que desde início de 1972 é pretendida por quem tem curriculum para a reclamar (Soeiro, 2003: 3).
As Relações Públicas em Portugal tiveram início nos anos 60, e na seguinte década a profissão já tinha algum relevo dada a sua juventude, sendo exercida eficientemente na TAP, em certas instituições bancárias, em petrolíferas multinacionais e curiosamente (ou não) na Administração Pública (Soeiro, 2003: 1). Em 1978 foi aprovado na assembleia-geral da CERP em Portugal, o Código Deontológico do Profissional de Relações Públicas, tendo como título universal, Código de Lisboa (Soeiro, 2003: 1). A actividade foi-se desenvolvendo e aumentando em Portugal até aos dias de hoje, sendo utilizada hoje em dia em tudo que de grande se faz em qualquer ramo das actividades profissionais. Mas o problema é que a solução para protecção dos direitos de cada licenciado e ou profissional, ainda não está encontrada (Soeiro, 2003: 4). Como acima falei, independentemente do que se ache de um Relações Públicas, é justo reconhecer que eles são injustiçados pela fama que outros dão ao nome, devendo a situação ser revista, para uns não terem créditos pelo esforço de outros.
«A não ser obtido o desejado objectivo que há muito se impõe, teríamos que considerar as “Public Relations” como uma profissão paradoxal» (Soeiro, 2003: 4).
«Ser relações públicas em Portugal significa arriscar. Arriscamo-nos a ser mal interpretados pelas pessoas ao dizer “sou relações públicas”. Ainda nos vêm como a personalidade das festas, aquele que conhece muita gente e de quem toda a gente gosta» (Amaral, 2007: S.P.).
A tal solução terá de ser rapidamente encontrada, para que a actividade seja “real” no nosso país, e não continue a ser reconhecida como uma actividade de part-time para pessoas que não têm nada que fazer ao seu tempo.

2.2 - Entrevista a Renato Póvoas, profissional de Relações Públicas

JR - Como profissional da área o que são para si as Relações Públicas?

RP - Trata-se de uma disciplina que vive dentro do Marketing com o objetivo de construir determinadas perceções sobre marcas ou instituições. É também uma ferramenta estratégica e de ação, ajudando a desenvolver conhecimento para que este possa levar a uma atitude.

JR - Ao longo dos últimos anos como têm evoluído as mesmas em Portugal, e em que pontos poderiam estar mais evoluídas nos dias que correm no nosso país?

RP - Temos assistido a uma enorme evolução nos últimos anos em Portugal e no mundo a diversos níveis:
- Ensino: atualmente existem muitos cursos superiores que formam milhares de alunos todos os anos nesta área da Comunicação e RP;
- Consultoras: o mercado das consultoras de comunicação também cresceu bastante, existindo dezenas de empresas que prestam diversos serviços em regime de outsourcing. A dimensão das estruturas é muito variável (micro, pequena, média e grande dimensão), sendo que o principal player nesta área tem aproximadamente 100 pessoas;
- Empresas: todas as grandes empresas têm um departamento de comunicação na sua estrutura. A dimensão é muito variável, podendo ser de apenas uma pessoa ou um grupo mais alargado. Normalmente recorrem ainda a consultoria externa de uma forma regular ou pontual.

No entanto existem ainda um conjunto de problemas que dificultam a evolução das RP:
- Perceção errada do papel e trabalho destes profissionais;
- Falta de formação dos decisores que não conhecem as potencialidades desta disciplina para ajudar a alavancar marcas e empresas. Seria necessária uma maior componente de RP nos cursos superiores de Marketing, Economia e Gestão;
- Pouca propensão para a inovação em novas ferramentas e canais. Continuam a apostar em ações tradicionais que pouco ou nada resultam no atual paradigma da comunicação;
- A conjuntura atual de crise do mercado que leva ao esmagamento dos orçamentos de marketing das empresas, logo onde a aposta em RP é ainda mais reduzida ou mesmo nenhuma;
- A postura de certos players (consultoras de comunicação) no mercado:
                               - Ganham concursos com orçamentos muito baixos, o que leva a uma má execução do trabalho e obviamente o descontentamento de quem contrata;
                               - Prometerem “mundos e fundos” sem depois terem condições de cumprir (falsas expectativas);
                               - Pessoas com pouca experiência a assegurar tarefas e projetos de elevada responsabilidade.


JR - O facto das Relações Públicas serem uma actividade não regulamentada, altera os seus princípios para um campo mais negativo?

RP - Seria importante ter uma atividade mais regulamentada para que todo o setor e respetivos profissionais fossem mais respeitados e o seu trabalho fosse igualmente mais valorizado. Uma maior regulamentação seria certamente um importante contributo para que as pessoas tivessem uma perceção mais real do trabalho e valor das RP. Não existindo nada a este nível a tendência será sempre para desvalorizar a profissão.


JR - As publi-reportagens, são uma forma visível do comportamento pouco ético das relações públicas. O que acha desta ferramenta das Relações Públicas? E na sua óptica é ou não uma ferramenta pouco ética?

RP - As publi-reportagens podem-se enquadrar dentro das RP ao nível da produção de conteúdos. Não vejo como algo pouco ético pois o trabalho está identificado como tal. Os leitores quando encontram estas informações sabem, ou pelo menos deveriam saber, que é algo pago pela marca aí exposta. Não se tratam de conteúdos jornalísticos. Não nos podemos esquecer que as publi-reportagens foram uma “invenção” dos grupos de media. É mais uma fonte de receita que ajuda a rentabilizar os seus produtos/títulos. Trata-se de um negócio entre os media e as marcas onde as RP apenas entram na produção dos conteúdos. Estão à margem do processo, logo não afeta a credibilidade ou ética dos profissionais de relações públicas.      


JR - Concorda com o facto de que há manipulação legítima e manipulação ilegítima? Ou desde o ponto que se entra no conceito de manipulação será sempre um acto ilegítimo?;

RP - Na minha opinião não existe nenhuma manipulação. Os relações públicas estão sempre ao serviço de uma empresa, marca, pessoa, etc e os jornalistas sabem disso. Não podemos ser ingénuos. Qualquer fonte que entra em contacto com um jornalista defende sempre um interesse ou posição de alguém. As coisas devem estar claras. Caso não estejam o jornalista deverá questionar para perceber quais os reais interesses que estão por detrás.

O principal problema está no jornalista não fazer o seu trabalho – investigar, questionar, comparar fontes, e depois quando percebe que foi manipulado, culpa a sua fonte, que por norma é uma consultora de comunicação. Quem escreve as notícias são jornalistas e os editores é que controlam o que sai e o que não sai. Os relações públicas apenas fazem o seu papel: oferecer informação que possa interessar ao jornalista.


JR - Até que ponto é que o Marketing Político, por vias dos Relações Públicas, consegue transformar uma pessoa desconhecida na opinião pública num vencedor dumas eleições?

RP - As Relações Públicas, embora importante, são somente um ingrediente para o sucesso de um político ou campanha eleitoral. Existem um conjunto de fatores que influenciam esse resultado final. Contudo, se for feito um bom trabalho de RP (estratégia, planeamento, implementação, avaliação, correção de erros ou desvios) a probabilidade das coisas correrem bem é maior. Depois existe também a questão da influência do profissional de RP dentro da equipa de marketing… tem voz e conseguem influenciar o rumo das coisas?!! Ou é apenas um executante que está ao serviço de outros que desconhecem o poder das RP?!!! 
    

JR - Relativamente ao Spinning, o que acha desta área do Marketing Político?

RP - É algo muito relevante não só na área do MKT Político. Faz parte do trabalho de qualquer profissional de RP que por isso deve dominar as suas técnicas. No entanto, por norma, o spinning tem uma conotação negativa, pois está muitas das vezes associada a uma comunicação pouco ética. Eu defendo o spinning enquanto comunicação responsável e transparente, pois caso contrário pode ter um efeito negativo em termos de imagem e reputação para os envolvidos. Mais cedo ou mais tarde a verdade acaba por vir ao de cima…


JR - Finalmente, na sua opinião as Relações Públicas são ou não prejudiciais para a Democracia?

RP - Defendo e acredito que as Relações Públicas podem ter um importante papel ao serviço da Democracia. Elas contribuem para uma população mais esclarecida e próxima das instituições. Sem uma boa política de comunicação não existe partilha de informação com os cidadão e o tal engagement tão vital para uma Democracia saudável. A introdução de novas tecnologias são um bom exemplo disto mesmo. O Facebook, Twitter, blogs,… contribuíram decisivamente para uma maior aproximação e participação das pessoas nas atividades da Democracia. Haja vontade!

2.3 - Comparação “figurativa” do papel dos Relações Públicas “reais” com outros que inconscientemente também o são

Neste ponto irei abordar o tema que aparentemente, talvez menos se insira nas medidas do trabalho. George W. Bush teve Karl Rove, apelidado do seu cérebro durante os seus mandatos como Presidente dos EUA, para dar um exemplo. E agora mesmo num campo de ficção, atrevo-me a perguntar – e Harry Potter, quem tem do lado dele para continuar a lutar contra tudo e todos? Posso ser controverso ao tentar comparar algo real com ficção, mas o meu ponto de vista prende-se em mostrar que talvez a actividade de Relações Públicas já existia antes da sua invenção. Karl Rove, foi o estratega, o pensador dos actos de George W. Bush.
George W. Bush e Karl Rove
Eu como apreciador da saga Harry Potter atrevo-me a expor factos e comparar os amigos, os “Relações Públicas” de Harry Potter ao de Bush, Karl Rove, entre outros exemplos possíveis. Harry Potter é tal como o meu exemplo de Bush, quem dá a cara, quem é famoso. Mas por trás existe sempre alguém, que pensa conjuntamente estratégias e elabora planos para atingir determinados objectivos. Quem conhece a saga, certamente sabe que os melhores amigos de Harry são Ron Weasley e Hermione Granger. Pois lá está, esses mesmos melhores amigos, actuam como uma espécie de seus Relações Públicas ao longo da saga. A minha comparação pode ser deveras estranha, mas as semelhanças estão lá, com a diferença de que não são renumerados pelos seus “serviços”. Eles mentem por Harry, planeiam juntos estratégias para atingir determinado fim e muitas vezes arriscam as suas vidas e fazem sacrifícios (pessoais) por causa dos objectivos de Harry Potter ou da comunidade de bruxos, encabeçada por Harry Potter. Com objectivos diferentes dos políticos, juntos, através da inteligência de Hermione ou da bravura de Ron encontram respostas e alcançam sempre um plano capaz de concretizar objectivos.

Harry Potter, Hermione e Ron Weasley
No primeiro filme, Harry Potter e a Pedra Filosofal, depois de se conhecerem, ao longo do filme é notório as Relações Públicas a entrarem em cena. Um monstro ataca Hermione na casa de banho, os três miúdos nesta cena talvez sem um plano, conseguem mesmo assim vencer as adversidades quando ninguém imaginava tal potencial. O objectivo é sempre proteger Harry Potter seja do que for, dando eles o corpo pelo manifesto e se possível elevar o nome de Harry.


Mais à frente no filme, quando os três procuram desmestificar a Pedra Filosofal, aparece um tabuleiro de xadrez com peças reais. Nesta adversidade entra em cena o talento de Ron, estratega do xadrez, que com o seu conhecimento do jogo e alguma espírito de sacrifício, consegue que Harry Potter continue a sua caminhada para alcançar o seu objectivo. Poderia continuar a dar exemplos de como Harry Potter tem por trás da sua famosa figura no mundo dos bruxos, uma equipa de falsos Relações Públicas que, inconscientemente o são ao longo de toda a saga do filme.


Com esta exposição de factos espero ter conseguido demonstrar o meu raciocínio de que as Relações Públicas já existiam antes de serem inventadas, e que talvez todos nós já fomos pelo menos uma vez na vida, falsos Relações Públicas.

3.0 - Conclusão

A ilação que posso tirar depois de dar por terminado este trabalho é que as Relações Públicas, sendo uma actividade não regulamentada e reconhecida, têm aspectos bons e maus.
Talvez depois de trabalhar este tema mudei um pouco a minha forma positiva de ver as Relações Públicas, pois realmente ninguém é obrigado a fazer tudo que lhe mandam. Agora talvez defenda mais a actividade em si do que o profissional, que por vezes é manipulador ilegítimo.
Tal como Renato Póvoas, acima entrevistado, concordo que a Democracia já não seria a mesma sem os Relações Públicas, não deixando de admitir que por vezes eles são nocivos. Penso que com uma boa regulamentação e o devido reconhecimento a estes profissionais, aliados às novas tecnologias e redes sociais, a actividade tem tudo para dar o salto e limpar a má imagem que por vezes deixa no ar.